Ao chegar com sua mãe e sua avó, a uma festa em um lugar muito bonito e cheio de natureza, um menino de cerca de oito anos saiu logo de perto delas e foi explorar o local. Observávamos atentas, até que a avó nos contou, com certo desconforto, que ele sempre faz isso. Sai correndo de perto delas quando chegam a um lugar com árvores, espaço, bichos, e começa logo a brincar, animado.
Esse menino ama natureza, tá na cara. Mas isso preocupa a avó porque ela entende que, assim, ao “perdê-lo de vista”, perde a possibilidade de controlar seus gestos, de vigia-lo, de supervisionar seus passos. Como se isso significasse que ela não está cuidando dele, que não está assumindo sua responsabilidade sobre a criança, sobre sua segurança.
Essa situação nos levou à uma reflexão. O que essa avó disse reflete o que a sociedade, em geral, pensa: que tudo precisa estar sob controle. Há uma necessidade urgente de que todo planejamento seja perfeitamente cumprido, de que as situações se mantenham estáveis, de que nenhum imprevisto aconteça. Mas, quando pensamos na infância e na natureza, pensamos também vida. E a vida é viva. Nesse cenário, portanto, tudo pode acontecer a qualquer momento. A natureza é vida. As crianças são vivas! E é por isso que a conclusão a que podemos chegar é de que a infância não está sendo respeitada e as necessidades das crianças não estão sendo ouvidas.
É muito provável que a grande maioria das crianças, se tivesse oportunidade, faria como esse menino: estaria interessada na multiplicidade de “brinquedos” que a natureza oferece, se encantaria com essa abundância de formas, texturas, cores, cheiros, temperaturas, movimentos, alturas, luzes, e possibilidades imaginativas, que um simples ambiente arborizado oferece.
Isso nos deixa convencidas de que são os adultos que as estão tolhendo, que estão lhes tirando a oportunidade de se conectar com as coisas vivas, de se expor ao imprevisível, de sentir o sabor da liberdade, que deveria ser o principal elemento da infância.
Aos adultos cabe conversar, observar e estabelecer relações de segurança.
Uma infância plena requer liberdade para descobrir, imaginar, criar. Isso torna as crianças muito mais preparadas para crescer e atuar com toda a sua potência no mundo do que se permanecesse “presa” a pequenas telas iluminadas cheias de entretenimentos fugazes.
Ana Carolina Thomé e Rita Mendonça
Ana Carolina é pedagoga, especialista em psicomotricidade e educação lúdica, e trabalha com primeira infância. Rita é bióloga e socióloga, ministram cursos, vivências e palestras para aproximar crianças e adultos da natureza. Quando se conheceram, em 2014, criaram o projeto “Ser Criança é Natural” para desenvolver atividades com o público.